Marília Arnaud, premiada escritora paraibana, de Campina Grande, radicada em João Pessoa, autora de livros do porte de “Liturgia do Fim” (Tordesilhas, 2016), “O Pássaro Secreto” (Ed. José Olympio, 2021) e “The Book of Affects” (Sundial House, 2024) presenteou-me com uma belíssima resenha sobre meu livro “Um Olhar no Retrovisor e Outro na Estrada” (Literando & Afins, 2017), primeira obra após minha ousada decisão de enveredar pelo mundo da literatura, como projeto de aposentadoria. Antes, um livro e incontáveis relatórios e artigos técnicos.
Nosso encontro se deu em 2023, quando após leitura do seu livro “O Pássaro Secreto”, publiquei nas minhas redes sociais o comentário que segue:
Ler "O Pássaro Secreto", da paraibana de Campina Grande, Marília Arnaud, é trilhar por um roteiro cuidadosamente elaborado, de uma estética linguística própria de quem domina a riqueza do seu idioma e adornado de um profundo conhecimento que somente um leitor e amante de clássicos da literatura e da música é capaz de incorporar em seus textos.
Nessa prosa de ficção, Marília também traça severas críticas sobre como os seres humanos descuidam do seu estoque amoroso e quão primitivo e destrutivo é o tratamento das pessoas com necessidades emocionais não compreendidas.
Marília Arnaud conquistou seu lugar na minha estante, ao lado de Margaret Atwood.
Carrascoza não exagerou. É "um romance de alta voltagem lírica, coisa rara na ficção nacional."
"O bom escritor considera sempre sua obra inacabada.", diz Leyla Perrone-Moisés em "Mutações da Literatura no Século XXI". Marília é assim. Ela confessa, em texto sobre como escreve: "Na verdade, nunca fico inteiramente satisfeita com meu texto".
Muito obrigada, Marília, por sua acurada leitura e gostosa resenha!
Eis o que escreveu Marília Arnaud, em seu Facebook, dia 14 de maio de 2024:
Li o livro de Iêda Lima do início da tarde à noite de ontem. "Um olhar no retrovisor e outro na estrada" é uma autobiografia da paraibana, nascida em Campina Grande, que viveu a adolescência e parte da vida adulta durante os anos em que o Brasil esteve sob a ditadura militar deflagrada com o golpe de 64. Sensível e consciente da miséria e da ignorância que grassavam pelo país, Iêda integrou a JEC - Juventude Estadual Católica, em seus anos de estudante secundarista.
Seu périplo errante por cidades brasileiras e, mais tarde, por países que não eram seus, como exilada política, começou com a sua prisão em 1969, quando estudava História em Recife, trabalhava no Senac e, além de engajada no movimento estudantil de resistência à ditadura, era casada com um estudante de Filosofia, egresso da Ordem dos Jesuítas, militante ligado à Ação Popular.
Após dois meses de prisão, e respondendo a um processo militar, Iêda, grávida à época da primeira filha, e o marido decidem deixar Recife. Escondidos, veem o cerco se fechar com a prisão e morte de muitos dos seus companheiros, o que os leva a fugir para o Chile. Quando lá estavam, deu-se o golpe que depôs Allende, "o exílio dentro do exílio", e com a ajuda de José Serra, também exilado no Chile, conseguiram asilo político no Panamá de Omar Torrijos. A Alemanha, entre outros países brasileiros, aceitou receber os exilados políticos brasileiros. Iêda, o marido, a filha e um segundo filho ali nascido, viveram em Dresden até 1979, quando puderam retornar ao Brasil como anistiados.
Obviamente o livro não se resume a isso; há muito mais: os sentimentos de Iêda, o trabalho e os estudos, a relação com o marido e os filhos, suas impressões sobre a Guerra Fria, a divisão da Alemanha, o capitalismo e o socialismo, as ditaduras militares na América Latina.
Chorei ao ler as linhas que contam o retorno de Iêda e família, o reencontro com os familiares, a dura luta do recomeço, os novos desafios em um Brasil que engatinhava no caminho que o levaria à plena redemocratização.
Brava Iêda, parabéns!
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