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Foto do escritorIêda Lima

Beijo de Pestana - Efigênio Moura

"Beijo de Pestana" , de Efigênio Moura é muito mais que um romance ambientado na extinta Favela da Cachoeira, fincada no bairro José Pinheiro, onde nasci. Rico na alternância entre a correta linguagem escrita e a apropriação da oralidade nordestina, em especial das camadas marginalizadas da sociedade, essa obra constrói um jogo dialético entre dor e prazer, violência e compaixão, fome e solidariedade, intolerância e empatia, repressão e liberdade. 


A sensualidade e o erotismo permeia toda a história, sendo magistralmente relatados, dispensando pormenores que convidam o leitor a imaginar a cena, sem necessitar de mais palavras. O penúltimo parágrafo do capítulo “Empriquitada” é um dos exemplos: 


"Silêncio. O barulho agora era somente da garrafa de conhaque, despejando seu líquido empretecido em um copo ensebado. Depois, ouve-se nada. Surgem os suspiros, respiração ofegante. Palavras não faziam falta." 


Outro destaque vai para o cuidado com que Efigênio produziu o cenário da década de 70 do Século XX. Uma personagem, no romance já adulta, remexendo sua lata de biscoitos onde guardava preciosas lembranças, encontrou uma cédula feita com carteira de cigarros; sentiu-se recebendo-a das mãos do seu melhor amigo, que “quase bebido pelas enchentes, quase tragado pela violência do lugar, se fazia comerciante...Cada nota um valor...A nota mais baixa é de Continental sem filtro, vale um cruzeiro. A de Continental com filtro, vale cinco cruzeiros; a de Hollywood, dez; a de Minister, cinquenta; a de Arizona, cem e a de Carlton, quinhentos.”  


Fiz uma viagem no tempo. Quando criança, morava no Zé Pinheiro e minha avó materna na Cachoeira; essas notas eram a recompensa pela falta da moeda real.


Para não dar spoiler, encerro meu comentário sobre esse romance, que é um grito silencioso contra a fome, a homofobia, o abuso sexual e a exploração de crianças e adolescentes pelo crime, fazendo-lhe um convite a descobrir o que é um “beijo de pestana” e se deleitar com a riqueza da literatura nordestina, lendo esse paraibano de Monteiro e ocupante da Cadeira nº 18 da Academia de Letras de Campina Grande, José Efigênio Moura. Boa leitura!



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