O artigo “Pedra na Geni”, de Abelardo Jurema Filho (A União, 17/01/23), relembrando o clima de autoritarismo que se instalara no Brasil, após o golpe de 1964, e revivendo sua dor de filho de perseguido político pela ditadura militar, despertou-me especial curiosidade.
Coincidentemente, Abelardo de Araújo Jurema constava do meu portfólio de personalidades paraibanas sobre cujas vidas e obras eu pretendo escrever, neste ano de 2023, movida pela máxima de José Américo de Almeida de que a história perde o calor nos arquivos. Abelardo, o filho, abriu-me as portas das suas memórias, levando-me a descobertas inesperadas e maravilhosas sobre seus antecedentes, em especial seu pai, do qual falo agora.
Paraibano de Itabaiana, nascido em 15/02/1914, Abelardo Jurema iniciou seus estudos no Colégio São José, na sua cidade natal, dando continuidade ao ensino fundamental nos colégios Nossa Senhora do Carmo e Oswaldo Cruz, em Recife, e concluindo o ensino superior na Faculdade de Direito do Recife. Casou-se com Maria Evanise Pessoa (Vaninha) - sobrinha de João Pessoa, Presidente (hoje governador) da Paraíba, por parte de pai, e sobrinha-neta de Epitácio Pessoa, Presidente do Brasil. Dessa união com D. Vaninha Pessoa Jurema nasceram os oito filhos Oswaldo, Maria Amália, Elizabeth, Nara, Vanita, Rosalinda, Abelardo e João Luiz.
Foi professor de Literatura do Liceu Paraibano; articulista do Diário de Pernambuco, Diário da Tarde, Jornal do Comércio e Jornal O Norte; locutor da Rádio Clube da Paraíba, com leitura de crônicas diárias, reproduzidas pela BBC de Londres; redator do jornal A União e Diretor da Rádio Tabajara; gerente do escritório comercial da fábrica de cigarros Estrela do Norte, de propriedade do seu avô; diretor da Companhia Portela de Fibras, em Recife; Diretor do IPASE (INSS daquela época); e Secretário do Interior e Justiça da Paraíba (1957/58).
Iniciou sua carreira política aos 23 anos, nomeado como Prefeito de Itabaiana. Aos 32 foi Prefeito de João Pessoa. Eleito suplente do Senador Ruy Carneiro, o substituiu por duas vezes, entre outubro de 1953 a março de 1954 e junho a setembro de 1957, experiência contada no livro 102 dias no Senado. Em 1959 foi eleito Deputado Federal, reelegendo-se em 1962, pelo Partido Social Democrático (PSD), criado em 1945 por políticos egressos do período Vargas, dentre eles o médico mineiro, Presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira (1956-1961). Foi líder do PSD na Câmara e Liderança do Governo Juscelino Kubitscheck, entre 1959-1960. Entre 1963-1964 foi Ministro da Justiça do governo João Goulart, cargo que lhe rendeu o codinome de “ministro” pela vida afora, em reconhecimento ao seu enorme talento, como revelou Abelardinho no seu livro Cesário Alvim, 27 – histórias do filho de um exilado.
Mas a sua trajetória política foi interrompida, quando teve os seus direitos políticos e civis cassados com base no Ato Institucional nº 01, de abril de 1964, após o golpe militar. Preso em 01/04/1964, no Aeroporto do Rio de Janeiro e levado ao Quartel-General do Exército, na Urca, Abelardo Jurema conseguiu exilar-se na Embaixada do Peru, onde ficou por 45 dias, à espera do salvo conduto. Liberado, permaneceu no exílio por quatro anos, em Lima/Peru.
Sem direito ao salário de Fiscal da Receita Federal, contou com a ajuda de amigos e até de adversários políticos, para seguir sustentando a esposa e os filhos, órfãos de pai vivo. Ao retornar do exílio, sustentou a família trabalhando na iniciativa privada, tendo reconquistado os direitos políticos após a promulgação da Lei 6.683, de 28/08/1979, Lei da Anistia.
Ocupou a Cadeira nº 23 da Academia Paraibana de Letras. Em seu discurso de posse, em 14 de janeiro de 1982, após ser saudado pelo acadêmico Luiz Augusto Crispim, ministro Jurema revelou ser o seu maior sonho, concluir a sua vida a serviço da sua terra, na APL. A primeira sede da APL foi doada por ele, em 1945, quando ainda era prefeito de João Pessoa. Dentre os nove livros escritos por Abelardo Jurema destacam-se Sexta-Feira 13, Os últimos dias do Governo João Goulart, Exílio e Presença da Paraíba no Brasil.
Como membro do Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba, colaborou para a preservação da memória paraibana sob o lema: “Escrevo para a História, e não posso mentir.”
Cordial, ético, amigo, tolerante e pacificador em vida, Abelardo Jurema, falecido em 09 de fevereiro 1999, na cidade de João Pessoa, aos 85 anos de idade, ganhou a seguinte frase cravada em placa do seu túmulo, localizado no cemitério de Itabaiana: “No poder, sem querer ser mais do que um homem; no exílio, sem tolerar ser um centímetro menos que um homem”, escrita pelo jornalista Sebastião Nery em prefácio do seu livro Exílio.
Artigo publicado no jornal A União em 08 de Fevereiro de 2023
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